Exatamente há um ano, quando os primeiros ETCs de Ethereum à vista foram introduzidos nos Estados Unidos, poucos podiam prever que presenciaríamos uma das maiores mudanças de paradigma no mercado institucional de moedas digitais.
O que surgiu como uma opção secundária ao Bitcoin rapidamente evoluiu para algo muito mais relevante: uma evidência clara de que Wall Street finalmente percebeu que o universo crypto vai além da criptomoeda pioneira.
Os dados recentes não mentem, e contam uma história fascinante sobre a movimentação do dinheiro inteligente. Por 13 dias consecutivos no final de julho, os ETCs de Ether registraram entradas positivas que somam impressionantes US$ 4 bilhões – um montante que, para colocar em perspectiva, representa mais da metade de todo o capital captado por esses fundos em seu primeiro ano de existência.
A incrível quantia de US$ 533 milhões num dia
O dia 23 de julho de 2025 será lembrado nos anais dos fundos negociados de criptomoedas. Nessa data, os fundos de Ethereum receberam US$ 533 milhões em entradas líquidas, estabelecendo não apenas um recorde para a categoria, mas evidenciando algo que muitos analistas julgavam improvável: ETCs de Ether superando consistentemente seus correspondentes de Bitcoin em termos de procura diária.
Para dimensionar esse feito, é relevante lembrar que, na mesma semana, os ETCs de Bitcoin – até então vistos como os “líderes” do mercado institucional de criptomoedas – tiveram saídas líquidas de US$ 67,93 milhões.
A mudança é tão marcante quanto simbólica: pela primeira vez desde o lançamento dos produtos, o Ethereum não apenas concorreu com o Bitcoin pela atenção institucional, mas de fato o superou.
Vincent Liu, responsável de investimentos da Kronos Research, captou perfeitamente o momento ao notar que “os influxos nos ETCs de Ether à vista têm sido motivados pela baixa da supremacia do BTC e pela crescente vontade institucional de se expor ao ETH”. A afirmação, aparentemente técnica, oculta uma realidade mais profunda: estamos vendo uma redistribuição fundamental de como o capital institucional percebe o valor no ecossistema crypto.
BlackRock: o gigante que faz história
Se há um protagonista nessa trama, ele tem o nome e sobrenome: BlackRock. O iShares Ethereum Trust (ETHA) do enorme gestor não só liderou as entradas recentes com US$ 426,22 milhões em um único dia, mas alcançou algo próximo ao extraordinário no meio dos ETCs: atingir US$ 10 bilhões em ativos sob gestão em apenas 251 dias.
Para contextualizar esse feito historicamente, o ETHA tornou-se o terceiro ETC mais rápido da história dos Estados Unidos a atingir essa marca, ficando atrás somente dos próprios ETCs de Bitcoin da BlackRock e da Fidelity, que o conseguiram em 34 e 54 dias, respectivamente. Mas o detalhe pouco notado é: o crescimento do ETHA de US$ 5 bilhões para US$ 10 bilhões ocorreu em apenas 10 dias durante julho de 2025.
Eric Balchunas, analista de ETCs da Bloomberg, descreveu esse crescimento como “sem igual no mercado de fundos”. A comparação, advinda da gíria de negociação, é correta: da mesma forma que um movimento de preço tão rápido e vertical desafia explicações convencionais, o crescimento do ETHA desafiou todas as projeções conservadoras sobre a adoção institucional do Ethereum.
A implacável matemática da escassez
Enquanto os números de entradas impressionam, é a matemática subjacente da oferta e procura que realmente deveria atrair a atenção dos investidores. Matt Hougan, diretor de investimentos da Bitwise, apresentou uma análise que beira o alarmante para quem ainda não detém exposição ao Ether: a procura projetada pode ultrapassar a oferta nova numa proporção de sete para um.
Os cálculos de Hougan são elegantemente simples e terrivelmente persuasivos. Entre ETCs e empresas incorporando ETH em seus balanços corporativos, a procura pode alcançar US$ 20 bilhões no próximo ano – equivalente a cerca de 5,33 milhões de ETH com os preços atuais. No lado oposto da equação, estima-se que a rede Ethereum emitirá apenas 800 mil ETH no mesmo período.
“A curto prazo, o preço é ditado pela oferta e procura. E, atualmente, há muito mais procura por ETH do que oferta nova. Acredito que subirá”, afirmou Hougan com a confiante de quem fez os cálculos e não gostou do que viu – pelo menos do ponto de vista de quem ainda não comprou.
O primordial ano: uma viagem de descobertas
Para entender completamente o momento atual, é vital olhar para trás e compreender a jornada dos ETCs de Ether desde seu lançamento em julho de 2024. O primeiro ano foi, em vários aspectos, uma lição de modéstia para aqueles que esperavam uma adesão instantânea e abrangente.
Os nove ETCs lançados inicialmente acumularam US$ 8,69 bilhões em entradas líquidas durante seus primeiros 12 meses – um número considerável, porém que ficava pálido se comparado ao boom inicial dos ETCs de Bitcoin. No entanto, os dados agregados não revelavam a natureza bimodal dessas entradas: enquanto o ETHA da BlackRock continuava a atrair capital novo de forma consistente, o ETHE da Grayscale perdia US$ 4,3 bilhões em saídas conforme investidores migravam para produtos com taxas mais competitivas.
Essa dinâmica criou uma narrativa errônea de que os ETCs de Ether eram, na melhor das hipóteses, um êxito moderado. A realidade, como os acontecimentos recentes demonstraram, era que o mercado estava passando por um período de consolidação e descoberta de preços que preparou o terreno para a explosão de procura que testemunhamos hoje.
O estímulo staking: o a seguir catalisador
Se as entradas atuais já impressionam, o que está por vir promete ser ainda mais transformador. Várias gestoras de ETCs estão em negociações avançadas com a SEC para permitir o staking de Ethereum dentro dos fundos – um desenvolvimento que poderia alterar fundamentalmente a proposta de valor desses produtos.
O staking de Ethereum, que neste momento oferece rendimentos anuais de até 6,5%, representaria uma vantagem competitiva única dos ETCs de Ether sobre seus correspondentes de Bitcoin. Enquanto os ETCs de Bitcoin oferecem apenas exposição ao preço do ativo, os ETCs de Ether com staking poderiam produzir rendimento passivo para os investidores.
A aprovação do primeiro ETC com staking baseado em Solana no início de julho criou um precedente regulatório que muitos analistas acreditam facilitar a aprovação de produtos similares para Ethereum. A expectativa é que essa aprovação ocorra nas próximas semanas, potencialmente estimulando uma nova onda de adoção institucional.
O novo paradigma
Os dados dos últimos dias sugerem que estamos presenciando mais do que um período de alta temporária – estamos vendo o surgimento de um novo paradigma na adesão institucional de criptomoedas. Com US$ 19,85 bilhões em ativos totais sob gestão e representando 4,44% do market cap total do Ethereum, os ETCs de Ether já se consolidaram como uma força significativa no mercado.
A série de 13 dias de entradas positivas, totalizando US$ 4 bilhões, não é apenas um dado impressionante – é a evidência de que o dinheiro institucional finalmente reconheceu o Ethereum pelo que ele realmente representa: não uma alternativa ao Bitcoin, mas uma categoria de investimento completamente distinta e complementar.
Enquanto o Bitcoin continua sendo encarado como “ouro digital”, o Ether está emergindo como exposição ao que muitos concebem como a infraestrutura financeira do porvir. E se as entradas recentes forem alguma indicação, esse futuro está se aproximando mais rapidamente do que muitos previam.
A revolução silenciosa dos ETCs de Ether pode ter começado há um ano, porém está evidente que estamos apenas no início de uma transformação muito maior na maneira como o capital institucional interage com o ecossistema crypto. E para aqueles que ainda estão observando de longe, a matemática da escassez sugere que o momento de hesitar pode estar se esgotando rapidamente.
Sobre o autor
André Franco é CEO da companhia de análises crypto Boost Research e colaborador do Portal do Bitcoin. Analista de criptoativos desde 2017, Franco possui vasta experiência no mercado e já atuou como diretor de Research do MB | Mercado Bitcoin.
Fonte: Portal do Bitcoin